domingo, 4 de outubro de 2009

O Trabalho


Fonte: www.canteirodeprojetos.org.br



Dia 23 de setembro li no The Times uma reportagem inquietante a respeito de suicídios de empregados de uma empresa telefônica, na França. O assunto ganhou espaço na mídia, após o suicídio de uma moça de 32 anos, em Paris.

Nesta semana, por acaso, vi um telejornal anunciando mais um suicídio cometido por um funcionário de tal empresa. Ao total foram 24 funcionários que acabaram com suas próprias vidas, nos últimos 18 meses. O tema deixou de ser assunto interno da companhia. O presidente Sarkozy exigiu uma ação.

Há dois anos a empresa passa por uma reestruturação, exigindo, inclusive, que alguns profissionais mudem de cidade. Provavelmente, as mudanças causaram estresse e depressão, a ponto de um ato desesperador e desesperançoso.

Um sociólogo francês, ouvido pelo jornalista responsável pela matéria, afirma que o francês dá muita importância ao seu trabalho, que ele é algo definidor de sua identidade. É como dizer que em outros países, como na Inglaterra, as pessoas se definiriam torcedoras de tal time, por exemplo.

Discordo do sociólogo. Não vejo a profissão como definidora de identidade como uma particularidade meramente francesa, assim como não acredito que se eu conversar com um inglês ele se descreverá apenas como torcedor do Manchester United, por exemplo.

O trabalho é quase tão definidor da nossa identidade como o nome e o sobrenome. ‘Oi, meu nome é Liana, sou psicóloga’, é uma introdução comum, não te parece? Esta notícia da França me fez pensar na importância que damos ao setor profissional nas nossas vidas.

Supostamente, quando entramos na vida adulta, o trabalho passa a nos ocupar a maior parte do dia. Passamos mais tempo envolvidos com ele do que com nossas questões pessoais ou familiares.

De qualquer forma, mais da metade do dia é destinado a ele. Sua importância supera a questão do sustento, do dinheiro no fim do mês. Além disso, é uma questão de reconhecimento e principalmente, de realização pessoal.

A autoestima pode decair bruscamente quando o sujeito está desempregado ou em um cargo abaixo do que ele esperava ou do que esperavam para ele. A sensação de inutilidade é grande, mesmo que racionalmente reconheçamos que qualquer um de nós é muito mais do que a profissão que exercemos. Isso mostra o valor que damos ao nosso ofício de cada dia.

Quando fiz um estágio na faculdade, em que eu mantinha contato com desempregados, era muito claro o sofrimento que muitos dos que procuravam emprego se encontravam. Um olhar melancólico, meio que para baixo, com um pouco de vergonha de si mesmo.

Dizem que o bom profissional sempre encontra trabalho. Discordo. Nos dias de hoje, essa regra é inválida. Claro que a postura pessoal e seu currículo podem facilitar a ocupação de uma vaga, mas só isso não basta.

O trabalho expressa que papel exercemos na sociedade, de que maneira colaboramos para o seu funcionamento. Além disso, o que fazemos mostra muito o que somos. Assim, quando os conflitos neste âmbito se tornam muito angustiantes não afetam exclusivamente a esfera profissional, mas a questão existencial de cada um.

Um comentário:

  1. Li, faço minhas as tuas palavras!! Até pq, de certa forma, passei por essa aprovação da carreira profissional. Claro que ainda não estou no meu ápice, mas vejo como isso é importante na minha vida.
    Ter uma identidade profissional bem definida, muitas vezes, nos faz superar outros obstáculos pessoais que talvez fossem muito mais difíceis caso existisse essa lacuna na nossa vida!
    Além disso, exatamente como disse, o trabalho toma a maior parte do nosso tempo... Como não ser feliz o fazendo??
    Talvez essa seja a grande “charada” dos suicídios: Pessoas não satisfeitas e muito infelizes como o seu trabalho, o qual ocupa grande parte de suas vidas.
    Mas, em minha opinião e forma de encarar os desafios, nunca deixaria me levar para tamanha infelicidade em função do trabalho... só que isso já é uma questão de personalidade e não de postura profissional... ou até que ponto o trabalho domina a sua vida?
    Bjão, amiga

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